Histórias de Sucesso

Agricultura familiar

Fortalecendo pequenos produtores

Capacitações do Sebrae Minas transformam vidas nos vales do Jequitinhonha e do Mucuri


Laura Baraldi

Há 25 anos, os pequenos produtores Neidmar e Marcelo Macedo moram com o filho em uma propriedade rural em Itambacuri, no Vale do Rio Doce, em Minas Gerais. Até há pouco tempo, a principal fonte de renda da família era o trabalho de capina que Marcelo realizava em terrenos vizinhos. Neidmar, por sua vez, fazia faxinas e cultivava hortaliças para complementar a alimentação da família, e todo o excedente era comprado por vizinhos próximos. O trabalho era duro, mas o casal sempre sonhou ir além. E a oportunidade de evoluir surgiu por meio das ações do Sebrae Minas dirigidas a pequenos produtores rurais. “Logo busquei me inscrever. E foi a verdadeira virada na nossa vida”, conta Neidmar.

O casal, que antes produzia apenas uma variedade limitada de hortaliças, agora cultiva uma horta diversificada e está se inserindo no mercado de café orgânico. “Tínhamos dificuldade de administrar os negócios e a propriedade, mas com a capacitação do Sebrae aprendemos a ter controle de tudo o que entra e sai. Em apenas seis meses, passamos a sustentar a nossa família somente com a renda obtida no sítio”, diz Marcelo. A produção cresceu tanto que foi preciso empregar dois trabalhadores.

Como Neidmar e Marcelo, mais de 3 mil pessoas foram impactadas pelo trabalho de capacitação desenvolvido pelo Sebrae Minas desde 2019. As ações começaram em Teófilo Otoni, em parceria com a prefeitura local, Sindcomércio, Paróquia de São Francisco de Assis, Internato Rural, Comitê da Bacia Hidrográfica do Mucuri, Emater, Senar e Instituto Estadual de Florestas (IEF), com o objetivo de melhorar a qualidade de vida das pessoas no campo por meio da geração de renda.

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Em quatro anos, foram realizadas atividades de estímulo ao associativismo e ao cooperativismo, além de missões técnicas, capacitações sobre os programas de compras governamentais e seminários e cursos sobre produção agroecológica. “As ações são planejadas para contribuir para o desenvolvimento regional sustentável e potencializar a fruticultura, a cafeicultura, a olericultura (cultivo de hortaliças) e o agroturismo”, explica Deborah Constantino, analista do Sebrae Minas. O trabalho na extensa área rural dos vales do Mucuri e Jequitinhonha estimulou a demanda em outros 14 municípios (veja no mapa abaixo). Entre os principais resultados, destacam-se a certificação de mais de 200 pequenos produtores rurais para a venda direta de produtos agroecológicos e orgânicos e a realização da Feira de Produtos Agroecológicos e Orgânicos em Teófilo Otoni, que semanalmente reúne 15 produtores.

Vale de oportunidades

O padre Honório José Siqueira estimulou o programa
Crédito: Pedro Vilela

O padre Honório José Siqueira, morador de Teófilo Otoni, teve grande influência sobre a mudança vivida pelos pequenos produtores. Assim que chegou ao município, em 2019, o pároco percebeu que havia um terreno fértil para o desenvolvimento da agricultura na região, embora grande parte dos moradores do campo trabalhasse na cidade e se referisse ao lugar de origem como vale da miséria e da pobreza. “Resolvi, então, mostrar a eles o porquê de eu chamar as regiões do Mucuri e Jequitinhonha de vales de oportunidades: ambas têm bom clima, recursos hídricos e solo fértil. Ou seja, valia a pena incentivá-los a buscar conhecimento e capacitação e aproveitar o que a terra pode oferecer”, relata.

O desejo do padre de contribuir para a mudança ganhou corpo quando o trabalho do Sebrae Minas chegou à região. “As ações ajudaram as pessoas a encontrar um caminho. Nosso objetivo comum é possibilitar que elas escolham onde querem estar, sabendo que terão uma vida digna. Se o desejo é permanecer no campo, que tenham todas as oportunidades para isso”, reforça o pároco.

Escolha que pôde ser feita pelo agricultor Edimar Santos Nascimento, que vive a rotina do trabalho rural desde a infância, na antiga propriedade do pai, em Teófilo Otoni, onde ainda mora. Apesar da familiaridade com a terra, foi a partir do contato com o trabalho do Sebrae, em 2020, que ele entendeu a importância de se profissionalizar e de aprimorar processos. “Trabalhava em uma loja na cidade para complementar a renda, mas, quando conheci o programa, acreditei que era possível viver somente do meu sítio”, recorda.

Edimar Nascimento e a família trabalham com a agricultura e o turismo rural
Crédito: Pedro Vilela

Além de participar das atividades de capacitação, o agricultor contou com a ajuda da esposa e do filho para diversificar e aumentar a produção. E, ao cultivo e à venda de frutas e hortaliças, a família adicionou a recepção de turistas interessados no artesanato em madeira produzido por eles. “Na época do meu pai, as pessoas não tinham tanto conhecimento, e o trabalho era muito bruto. Hoje, temos recursos que nos permitem ter contato com processos e técnicas que agregam valor aos produtos e aumentam a rentabilidade”, observa Edimar. Para ele, maior do que a alegria de tirar o sustento da própria terra é ver que “todas as conquistas são resultado de um esforço feito em família”.

Acesso ao mercado

Entre os inúmeros desafios enfrentados pelos pequenos produtores rurais, o maior costuma ser a rentabilidade. Em geral, as propriedades são pequenas, com produção igualmente reduzida, assim como a margem de lucro. A analista do Sebrae Minas avalia que o caminho para a superação das limitações é possibilitar que os produtores tenham acesso a conhecimentos sobre planejamento, cronograma e manejo da produção. “É crucial saber identificar as culturas mais adequadas e favoráveis, além das técnicas de produção, que fazem toda a diferença em termos de produtividade”, explica Deborah.

Após essas orientações essenciais, é preciso ir além da própria porteira e trabalhar as vendas. “O acesso a mercados é outro fator determinante do sucesso. Os agricultores familiares podem comercializar seus produtos na região por meio de mercados públicos, que garantem uma remuneração mais satisfatória, ou em lojas que valorizam produtos frescos, orgânicos e direto da fazenda”, orienta a analista. Ela destaca que outro canal importante são os programas de compras dos governos federal, estadual e municipal, que adquirem produtos da agricultura familiar para direcioná-los a iniciativas voltadas à segurança alimentar, como merenda escolar.

“Os agricultores passam a ter condições de negociar sua produção e a ter escala para ampliá-la. A geração cada vez maior de excedentes e a capacidade de colocar os produtos no mercado, por sua vez, trazem recursos financeiros que resultam em dignidade, sentimento de pertencimento e qualidade de vida, além de orgulho por serem importantes para o desenvolvimento da região em que vivem”, diz Deborah.

“A nossa vida só tem sentido quando nossas ações ajudam as pessoas. Quando vejo um agricultor ou uma agricultora conquistando qualidade de vida, fico feliz. A alegria das pessoas é o que me realiza”, conclui o Padre Honório.