
Turismo
CONEXÃO COM O SAGRADO E A NATUREZA
Sebrae Minas trabalha para fortalecer iniciativas de turismo religioso no estado
Josie Menezes
Aparecida, em São Paulo, Juazeiro do Norte, no Ceará, e Salvador, na Bahia, são alguns dos principais locais de turismo religioso no Brasil. Mas, há muitos outros destinos de norte a sul do país: o Ministério do Turismo elenca que há mais de 300 municípios com rituais e riquezas culturais e históricas, 96 deles com um calendário de eventos exclusivos. Segundo o órgão, cerca de 15 milhões de pessoas por ano viajam motivadas pela fé e devoção, movimentando quase R$ 15 bilhões.
É uma iniciativa do Sebrae Minas para fomentar o turismo em Minas Gerais, promovendo e divulgando experiências turísticas de diferentes destinos do estado. Atua na melhoria da competitividade dos pequenos negócios locais e na estruturação de produtos e destinos turísticos, qualificando empreendedores e fortalecendo as cadeias relacionadas ao turismo.
Desde 2017, o Sebrae Minas vem articulando com o poder público, associações, sempresas, instituições religiosas e comunidades de diversas regiões do estado para mapear rotas e fomentar o turismo religioso em Minas Gerais. As iniciativas são promovidas por meio do programa Check-in Turismo
A analista do Sebrae Minas Nathália Milagres explica que o objetivo é auxiliar os municípios para que a atividade turística seja menos sazonal. Para isso, é feito um trabalho junto às igrejas, às prefeituras e às entidades empresariais, visando criar produtos e eventos que englobem todo o recurso cultural e histórico daquela região. Nathália ressalta que é importante movimentar a economia local ao longo de todo o ano e não apenas nas datas em que há maior concentração de turistas atraídos pelas festas religiosas. “Temos atuado na valorização e organização das rotas, sensibilizando os empresários sobre as possibilidades de impulsionar os negócios com o turismo”, pontua.

Créditos: Dante Bragança
As ações do Check-in Turismo estão sendo desenvolvidas no Sul de Minas, com as rotas Caminho de Nhá Chica e Caminho da Agonia; no Vale do Jequitinhonha e Mucuri, com os Caminhos Franciscanos; no Noroeste, com o Caminho de Nossa Senhora da Lapa, além de um projeto com as diversas manifestações culturais e religiosas dentro do Quilombo São Domingos, em Paracatu, mais uma riqueza cultural incorporada ao turismo mineiro. No Triângulo, a história de Chico Xavier é destaque em Uberaba.
Caminhos Franciscanos
Há 150 anos, os frades capuchinhos Frei Gaspar, Frei Ângelo, Frei Serafim e Frei Inocêncio chegaram à região do Vale do Mucuri com a meta de formar ali uma aldeia, uma freguesia e até uma cidade. No início do século XX, foi a vez das clarissas franciscanas. E os trajetos percorridos pelos religiosos tornaram-se a Rota Caminhos Franciscanos, buscada por milhares de peregrinos atualmente.
A rota foi mapeada com potencialidades turísticas identificadas em 25 municípios e conta com 30 empreendimentos capacitados e credenciados no guia turístico, tanto na área urbana quanto na zona rural. A analista do Sebrae Minas Déborah Constantino explica que o trabalho começou em 2017, absolutamente do zero, e que a região não tinha uma cultura voltada para o turismo “Tivemos de conscientizar as comunidades para que entendessem o próprio potencial em relação ao empreendedorismo”, recorda.

Créditos: Divulgação
Déborah relata que foram ofertadas oficinas e consultorias de atendimento ao cliente, gestão de marketing e finanças aos negócios mapeados. Além disso, também foram identificadas potencialidades para a criação de novos produtos turísticos, incluindo o Circuito Turístico das Pedras Preciosas. “Atualmente, a consultoria está voltada para o fortalecimento da governança que foi constituída para a rota, a Associação dos Caminhos Franciscanos (Acaf).”
E o que mudou na região? Quem responde à pergunta é o presidente da Acaf e diretor-presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Itambacuri, Paulo Sérgio Almeida Santos. Ele afirma que o turismo religioso deu novas perspectivas aos municípios. “Os empreendedores da rota agora têm novos horizonte com a movimentação turística. São artesãos, quitandeiras e outras pessoas que antes tinham pouca ou nenhuma fonte de renda”, relata.
É uma pequena igreja localizada dentro da Basílica de Santa Maria dos Anjos, em Assis, na Itália. O local tem grande significado para os franciscanos, pois foi lá que São Francisco de Assis teve experiências místicas e fundou a ordem dos frades menores.
O padre Honório José de Siqueira concorda que a rota resgatou a autoestima dos moradores do percurso, que, segundo ele, estavam bastante desacreditados. “Esse trabalho de orientação para o empreendedorismo tem feito um bem muito grande a todos que moram ali e se sentiam esquecidos”, diz. Atualmente, o religioso trabalha em um grande atrativo para os visitantes da Rota Caminhos Franciscanos: o local terá a réplica da Porciúncula de Nossa Senhora dos Anjos Porciúncula de Nossa Senhora dos Anjos
Reconhecimento

Créditos: Leonardo Morais
As Marias Artesãs, de Teófilo Otoni, fazem artesanato em bambu e palha há cerca de 45 anos. Tudo começou com a Dona Lourdes, que repassou os conhecimentos às filhas e netas. Mas só recentemente o trabalho teve o merecido reconhecimento. Quem conta essa história é uma das artesãs do grupo, Cleonice de Souza Ferreira, da terceira geração das “Marias”. “No tempo das minhas antecessoras, era triste quando elas tentavam comercializar. Ninguém dava valor no mercado e, por uma questão de sobrevivência, as peças eram trocadas por mantimentos”, relembra.
Entre as peças produzidas estão cestas, luminárias e outros itens decorativos. Segundo Cleonice, o trabalho exige dedicação e superação de desafios constantes. “É preciso habilidade para preparar o bambu e confeccionar as peças, e o processo muitas vezes é dificultado pelo clima, pois a umidade pode danificar o produto.” Ao longo dos anos, as artesãs aprimoraram as técnicas, conferindo melhor acabamento às peças, mas, ainda assim, não havia retorno financeiro. Foi com o projeto da Rota Caminhos Franciscanos e as capacitações que isso mudou. “A verdade é que nós mesmas não sabíamos que nosso trabalho tinha tanto valor. Foi com a rota que ganhamos reconhecimento. Hoje, outras cidades e estados fazem contato e encomendam nosso artesanato pelo Instagram. Posso dizer que ficamos conhecidas até mundialmente, pois uma pessoa do exterior viu um vídeo nosso e adquiriu peças que já estavam há bastante tempo disponíveis”, revela Cleonice.
Quem também traçou nova rota de vida com os Caminhos Franciscanos foi Elza Maria Rodrigues Soares. Após perder o filho Thiago, ela se mudou de Teófilo Otoni para um sítio na Comunidade Brejaúba, em 2007. No local, passou a receber peregrinos, inicialmente na própria casa. Depois, ampliou o receptivo para pousada e fez uma homenagem ao filho falecido, dando o nome de Sítio Velho Thio.

Créditos: Leonardo Morais
Atualmente, Elza disponibiliza no local cinco chalés, área para pesca, deck, piscina e churrasqueira, oferecendo pernoite com jantar e café da manhã aos peregrinos. “A gente vivia numa luta danada, e a rota melhorou muito as nossas condições”, conta a proprietária.
Ciclistas e peregrinos
Imagine pedalar por belas paisagens, morros e matas fechadas e ainda aproveitar para ter um tempo de reflexão. Essa mistura de ciclismo e peregrinação é a aposta da Rota Caminho de Nossa Senhora da Lapa, que está sendo preparada pelo Sebrae Minas desde 2023 na região de Vazante, no Noroeste do estado, com mapeamento e levantamento de informações do território. A analista Isabella Silva destaca que a região tem grutas com aspectos naturais que chamam a atenção dos peregrinos. Ela também revela uma curiosidade detectada durante a fase de mapeamento: “Há um registro de aparição mariana, a única em Minas Gerais”, conta.
O primeiro pedal foi lançado em novembro do ano passado, num percurso de 23 km até a Gruta de Nossa Senhora da Lapa, em Vazante. Em paralelo ao trajeto dos ciclistas, outro grupo de peregrinos fez o percurso a pé. A rota prevê, ainda, atrativos religiosos, artesanato e café da manhã, lanche e almoço oferecidos por empreendedores locais.

Créditos: Arquivo Sebrae Minas
A analista do Sebrae Minas relata que, após vários workshops para mostrar o potencial turístico aos empreendedores locais, a governança está sendo implementada com a criação do Núcleo do Caminho de Nossa Senhora da Lapa na Agência para o Desenvolvimento Local, Integrado e Sustentável de Vazante-MG e Região (Advaz), a implementação da Pastoral do Turismo de Vazante e a inserção de representantes do Conselho Municipal de Turismo (Comtur), responsável pela atualização do plano turístico. A ideia é mapear um segundo ramal, que irá de Claro de Minas até Guarda-Mor, acrescentando um percurso de mais 40 km. “O município de Guarda-Mor tem veneração por Santa Rita de Cássia e possui um pequeno fragmento dela, mais uma relíquia da região”, afirma Isabella.
Leila e Almir Ribeiro, proprietários do Bar 3 Corações, estão inseridos na rota em Claro de Minas, distrito de Vazante. No local é servido o café da manhã da rota. Muito envolvidos no projeto, o casal apresentou ideias para incrementar atrativos ao percurso. “Os peregrinos percorrem uma distância bem longa, e consideramos importante pensar em acrescentar trechos da estrada antiga,onde aconteceu o primeiro milagre de Nossa Senhora da Lapa em Vazante”, diz Almir. Leila está feliz por participar da iniciativa, pois considera que o casal está adquirindo novos conhecimentos e fazendo amizades. “Ficamos muito felizes com o convite para participar desta caminhada de fé”, diz.

Créditos: Dante Bragança
A agente de desenvolvimento da Advaz, Ubirana Magela, acredita que a rota vai transformar uma celebração pontual em uma vivência contínua na região de Vazante, “Seremos capazes de atrair visitantes de todos os cantos, assim como já acontece com outros caminhos consagrados no mundo. É uma experiência que todos deveriam ter”, pontua.
Padre Marcos Antônio da Silva ressalta que a paróquia local sozinha não teria condições de consumar um projeto como o Caminho de Nossa Senhora da Lapa. “Agora, para que o turismo religioso continue a crescer aqui, em Vazante e região, tudo vai depender de uma construção coletiva entre as paróquias, as instituições e a comunidade. Os benefícios são para todos”, planeja.
Caminhos Franciscanos
Caminho de Nossa Senhora da Lapa
