Histórias de Sucesso

Entrevista

Arte com mineiridade

Priscilla Lins, gerente de Agronegócios e Artesanato do Sebrae Minas, traça um panorama do setor artesanal mineiro, seus desafios e oportunidades


Thais Nascimento

O artesanato é uma expressão cultural que reflete identidades e tradições locais e movimenta a economia criativa em todo o Brasil. A atividade contribui com 3% do PIB, envolvendo cerca de 8,5 milhões de pessoas que vivem do artesanato. Em Minas Gerais, o setor reúne cerca de 11 mil artesãos com carteiras da profissão emitidas.

Para entender sobre os desafios, as oportunidades e as iniciativas voltadas ao fortalecimento do artesanato no estado, a Revista Histórias de Sucesso conversou com Priscilla Lins, gerente de Agronegócios e Artesanato do Sebrae Minas. Ela manifestou otimismo quanto ao cenário para o setor e destacou as iniciativas realizadas para valorizar o artesanato mineiro.

Crédito: Arquivo Sebrae Minas

De uma forma geral, qual é o cenário do artesanato mineiro e como o setor se posiciona no contexto nacional?
Segundo o IBGE, o mercado de artesanato no Brasil movimenta bilhões de reais por ano, contribui com 3% do PIB brasileiro e está em 67% dos municípios brasileiros. São cerca de 8,5 milhões de pessoas que vivem do artesanato, sendo a maioria mulheres. São números muito expressivos, e só não são maiores porque muitos artesãos ainda são informais e não possuem a Carteira Nacional do Artesão.

Regulamentada em 2015, a profissão de artesão, conforme designada pelo Ministério da Cultura, presume o exercício de uma atividade predominantemente manual, que pode contar com o auxílio de ferramentas e outros equipamentos, desde que visem a assegurar qualidade, segurança e, quando couber, observância das normas oficiais aplicáveis ao produto. A atividade pode ser desempenhada de forma individual, associada ou cooperativada.

Espelho da nossa cultura, o artesanato mineiro é diverso, inclusivo e retrata nossa história. São mestres e mestras, artesãos e artesãs que transformam o barro, a madeira, a pedra e tantas outras matérias-primas em arte com “mineiridade”! Essa palavra difícil de traduzir, mas que está materializada no nosso artesanato, na nossa culinária e no jeito de viver do mineiro.

Eu diria que o cenário para o artesanato mineiro é promissor! Consumidores interessados no que é local, autêntico, transparente, ético, artesanal, simples, exclusivo, que tenha história e que proporcione novas experiências têm colocado o artesanato no centro das atenções.

De que forma as estratégias de valorização do artesanato se conectam com as expectativas do novo consumidor?
Os consumidores estão usando seu dinheiro para alinhar suas compras às suas crenças de sustentabilidade, ética e responsabilidade social. O foco, que anteriormente era dado apenas ao produto, deu lugar a interesses muito mais nobres e alinhados com as necessidades do mundo. Os consumidores querem saber quem produziu aquele item, como e onde foi produzido. E o novo posicionamento do Sebrae Minas está totalmente alinhado a esse desejo dos consumidores, por meio de um trabalho que valoriza e impulsiona o artesanato de origem.

Como o Sebrae Minas tem apoiado o artesanato no estado?
Temos atuado com a metodologia de Identidade e Origem e com a perspectiva de que o consumidor valoriza aquele produto que é único e que tem uma procedência também única – sua Origem. Trabalhar com o artesanato sob essa perspectiva gera valor e constrói uma diferenciação relevante em termos de competitividade dos negócios, inspirando o consumidor em suas decisões de compra. Ao mesmo tempo, gera um movimento dentro do território, por meio do senso de pertencimento que move os seus atores na direção de mudanças positivas que levam ao desenvolvimento. Isso se dá por meio da atração de investimentos, da visibilidade pública e política, da geração de renda e do valor compartilhado.

Projetos de Identidade e Origem têm sido incentivados pelo Sebrae Minas em regiões com vocação econômica definida, como o Vale do Jequitinhonha e o Urucuia Grande Sertão Veredas. Nas duas experiências, a metodologia tem gerado resultados que vão muito além da venda do artesanato e alcançado algo muito mais sustentável.

Quais os desafios do artesanato na atualidade?
Por mais que exista uma forte tendência pela busca por produtos exclusivos, diferentes e com história, o preço dos industrializados e das cópias sempre exercerá uma pressão nos produtos feitos artesanalmente. Mas sempre existirá espaço para a originalidade, singularidade e exclusividade que o artesanato entrega para seus consumidores.

Outro desafio é convencer os artesãos da importância de serem menos intuitivos e mais capacitados para gerenciar suas empresas. Separar a arte do negócio pode parecer difícil, mas é necessário. Estamos investindo muito na criação de abordagens cada vez mais adaptadas às realidades dos artesãos, com trilhas dentro do nosso projeto Origem Minas, para facilitar essa mudança de comportamento, que é essencial.

O programa Origem Minas divulga o trabalho de artesãos e pequenas agroindústrias em eventos estratégicos
Crédito: Alexandre Rezende Nitro

Sobre o Origem Minas, qual tem sido o foco do trabalho?
O Origem Minas tem desempenhado um importante papel de capacitar os artesãos em empreendedorismo, gestão, inovação e acesso a novos mercados, da mesma forma que aconteceu com as pequenas agroindústrias de Minas Gerais, quando da criação do projeto em 2014. São inúmeras capacitações formatadas para atender aos diferentes perfis e necessidades dos artesãos.

E sobre o Feito à Mão? Fale mais sobre o projeto e as ações previstas.
O Feito à Mão é uma iniciativa do Sebrae Minas voltada para a preparação de empreendedores que desejam transformar suas habilidades manuais em negócios relacionados ao empreendedorismo artesanal. O projeto é focado em artesãos e pessoas que utilizam ofícios manuais para desenvolver produtos comerciais, mas que não se baseiam em técnicas ou recursos tradicionais como argumento de venda. Esses empreendedores enfrentam desafios relacionados à produção e ao atendimento das demandas de mercado de forma economicamente viável.

A iniciativa reconhece a necessidade de uma abordagem diferenciada para artesãos que produzem de forma manual, uma vez que as características e as conexões desse público com o mercado são distintas das do artesanato tradicional. Por isso, o Sebrae Minas desenvolveu uma abordagem específica para atender a essas demandas, adaptando o modelo de apoio às necessidades desse grupo crescente de empreendedores.

Em 2025, o Feito à Mão expandirá suas ações com trilhas de capacitação em diversos municípios de Minas Gerais, oferecendo ferramentas, consultorias e acesso a novos mercados para que esses artesãos possam melhorar suas produções, atender melhor seus clientes e fortalecer seus negócios.

Quais têm sido os avanços e quais são as perspectivas para 2025?
As mudanças nunca param de acontecer e nos estimulam a estar sempre acompanhando os movimentos para atualizar nossa estratégia com artesãos e territórios. Atuar com as origens foi um acerto, que está sócomeçando a gerar resultados. Tem muito mais por acontecer a partir dessa estratégia. Tem crescido o interesse de colaboração entre designers, escolas de arte, estilistas, lojas, arquitetos e decoradores com artesãos. É o mercado encantado com toda a aderência do artesanato com os desejos do novo consumidor. Mas precisamos ficar atentos à falta de limites da colaboração. A cultura, a tradição e o modo de fazer de cada lugar e cada artesão precisam sempre ser preservados. Mudar a essência do artesanato para atender ao mercado não está em questão.

Em 2025, o Sebrae Minas quer avançar em novos territórios, capacitar ainda mais artesãos e abrir novos mercados para fortalecer o empreendedorismo local e incentivar o desenvolvimento de pequenos negócios artesanais de Minas Gerais.