Histórias de Sucesso

Inova Cerrado

O futuro do Cerrado

Sebrae fomenta proteção e conservação do bioma


Thaís Nascimento

Por definição, biomas são conjuntos de ecossistemas (vegetal e animal) com diversidade biológica própria e, por isso, cumprem papel importante na manutenção do equilíbrio ecológico global. No Brasil, há seis biomas, entre os quais o Cerrado, que cobre 25% do território nacional, de acordo com o Ministério do Meio Ambiente, e abriga mais de 6 mil espécies de árvores e 800 aves catalogadas. Em Minas, o bioma ocupa cerca de 54% da extensão do estado, abrangendo 55 municípios do Triângulo, Alto Paranaíba, parte do Alto São Francisco e Noroeste, incluindo áreas de grande representatividade econômica.

Especialistas apontam que ações como a exploração desenfreada dos recursos naturais, as queimadas e o desmatamento, somados aos efeitos das mudanças climáticas, têm colocado a sobrevivência do Cerrado em risco. Nesse contexto, incentivar soluções inovadoras, que aliam sustentabilidade ambiental, social e econômica, é essencial para garantir a conservação do bioma.

Com o propósito de fomentar iniciativas empreendedoras que contribuam para o futuro desse patrimônio natural, o Sebrae promoveu o Inova Cerrado. Realizado em âmbito nacional, o programa apoia o desenvolvimento de empreendimentos e ideias inovadoras que visam à preservação e ao uso sustentável do bioma. No ano passado, 270 ideias foram contempladas em nove estados: Bahia, Distrito Federal, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Piauí e Tocantins.

Fases

A metodologia do Inova Cerrado compreende dois módulos. O primeiro é o de Ideação, que contempla o estágio inicial da ideia ou produto. Durante três meses, capacitações e mentorias são realizadas para validar a ideia perante o mercado. E a conclusão se dá por meio de um demoday, um grande evento de apresentação dos projetos, com premiação das três ideias vencedoras.

Já o segundo módulo é denominado Tração com um trabalho personalizado para propor soluções para as necessidades das participantes, visando fortalecer sua presença no mercado. Sua duração é de seis meses, período em que o participante recebe uma bolsa-sócio-empreendedor, para que possa se dedicar integralmente ao projeto.

Em Minas Gerais, a fase de Ideação ocorreu no segundo semestre de 2024. De um total de 92 inscrições, foram selecionados 30 empreendimentos e ideias. Os critérios utilizados envolveram desde potencial para atender a determinada demanda do mercado, diferencial em relação aos concorrentes e impacto socioambiental, até capacidade técnica da equipe envolvida em torno da ideia.

O evento de encerramento da Ideação ocorreu em 30 e 31 de janeiro de 2025, em Uberaba. Dezenove participantes apresentaram suas ideias, e os três vencedores foram anunciados: Predativa, Smart Timber e Chama Segura. “O Cerrado é essencial ao equilíbrio ambiental do Brasil, gerando recursos valiosos e abrigando uma rica biodiversidade. Assim, concluímos o módulo de ideação com projetos promissores, que contribuem diretamente para a preservação desse bioma”, ressalta a analista do Sebrae Minas Luisa Vidigal.

Ainda não há previsão para a segunda edição do Inova Cerrado Ideação, com o módulo Tração sendo realizado ao longo de 2025.

Insetos do bem

Pedro Tomaz é diretor-executivo da Predativa, empresa que produz insumos para a criação de insetos usados no controle de pragas em plantações
Crédito: Pedro Vilela

Uma das vencedoras foi a Predativa, de Patos de Minas, Noroeste do estado. A empresa desenvolve equipamentos, software e automação industrial para a criação de insetos predadores usados no controle de pragas em plantações. “O uso de insetos é estudado em todo o mundo por sua eficácia e sustentabilidade no controle de pragas agrícolas”, ressalta Pedro Tomaz, diretor-executivo da Predativa. Ele observa que a tecnologia permite reduzir de forma significativa a utilização de pesticidas químicos e, em consequência, os impactos negativos causados aos recursos naturais e à saúde humana.

O empreendedor conta que a ideia surgiu em um trabalho com o Centro Universitário de Patos de Minas (UNIPAM), no qual foi observada a eficácia do uso de insetos predadores no controle biológico de pragas agrícolas. No entanto, era necessário criar soluções para produzi-los. Isso foi viabilizado por meio de editais de fomento, tendo como resultado o desenvolvimento de equipamentos inéditos no mercado, que apresentaram grande facilidade de manuseio.

A tecnologia desenvolvida e premiada no Inova Cerrado foi a biounidade automatizada on farm, que é instalada diretamente nas áreas de plantações e pode ser operada pelo próprio produtor rural. Ela é composta por uma estufa que garante o controle climático para a reprodução de insetos predadores de pragas. A temperatura é controlada por meio de um sistema atrelado, que mantém o ambiente adequado à reposição de alimentos e à limpeza dos equipamentos. Além disso, a tecnologia é capaz de substituir boa parte da mão de obra necessária à reprodução dos insetos.

Para melhor manuseio da biounidade, a startup oferece os insumos necessários à criação dos insetos, consultoria para o entendimento da tecnologia e um software de operação da estufa. A novidade está em fase de validação, com testes em campo na cultura de café na Fazenda Estrela Carvalho, em Coromandel, no Triângulo Mineiro.

A participação da empresa no Inova Cerrado contribuiu para o alinhamento do modelo de negócio, definição do público-alvo e networking com atores estratégicos. Após os testes em campo, a startup pretende oferecer mais biounidades ao mercado e alavancar mais recursos para investir em uma maior capacidade produtiva, que será viabilizada com a premiação no programa. “A premiação será de grande importância para a produção de mais equipamentos e a oferta da tecnologia sustentável para cada vez mais produtores”, comemora Tomaz.

O que é greentech?
O termo denomina empresas de tecnologia com atividades voltadas para a sustentabilidade, a preservação de recursos naturais e a conservação ambiental.

Madeira legal

Outra ideia vencedora no Inova Cerrado foi a da greentech Smart Timber, localizada em Lavras, no Sul de Minas. A empresa criou uma plataforma que utiliza inteligência artificial para a rastreabilidade da madeira utilizada na fabricação de móveis, de forma a possibilitar a identificação de sua origem.

Seu fundador, Paulo Duarte, é engenheiro ambiental e teve a ideia durante o mestrado e o doutorado em Ciência e Tecnologia da Madeira na Universidade Federal de Lavras (UFLA). Em 2020, ele criou uma conta no Instagram, de forma despretensiosa, para compartilhar seus estudos. A partir daí, portas se abriram.

Paulo Duarte, fundador da Smart Timber, criou uma plataforma para rastrear a procedência da madeira
Crédito: Arquivo pessoal

No Inova Cerrado, em conjunto com um desenvolvedor de software, que é seu sócio, Duarte encontrou um caminho para combater a comercialização de madeira de origem ilegal, para prevenir impactos de ordem financeira, social e ambiental.

A ideia consistia na criação de um sistema operado por inteligência artificial, para reunir informações sobre cerca de 20 espécies de madeira nativa. O empresário explica que a solução se baseia em gêmeos digitais, ou seja, a representação virtual de processos, objetos ou sistemas físicos. “Então, trabalhamos para digitalizar a operação de logística e de gestão simplificada da madeira. Há um sistema, e nós conseguimos fazer algumas automações por inteligência artificial para garantir a procedência da madeira”, explica.

O Documento de Origem Florestal (DOF) é obrigatório para transporte dos produtos florestais no brasil e comprova sua procedência.

A ferramenta funciona da seguinte forma: o usuário acopla à câmera do celular uma lupa específica para análise da madeira. Ao gerar a imagem para o módulo de identificação do software, a madeira é reconhecida e são informadas suas principais características, como espécie, localização, acabamento. Os dados informados no módulo de identificação são incluídos pelo gestor do sistema, no caso, a empresa fornecedora da madeira. As informações podem ser preenchidas por meio do Documento de Origem Florestal (DOF) ou de forma manual.

A ideia encontra-se em processo de validação por dois clientes e, a partir dos feedbacks, a expectativa é aprimorar cada vez mais as funcionalidades da plataforma e aumentar a base de clientes.

Duarte ainda observa que o produto florestal pode ter duas origens: legal, quando é conectado ao meio ambiente e a práticas sustentáveis, ou a rastros de ilegalidade, como desmatamento não consentido e comércio proibido. “Logo, a pergunta que fazemos é: em qual dos dois lados o cliente quer estar?”

Combate a incêndios

Lucas Leal é brigadista florestal voluntário e foi um dos criadores da Chama
Crédito: Pedro Vilela

A criação do aplicativo Chama foi mais uma iniciativa premiada. O objetivo da plataforma é organizar as informações das brigadas voluntárias de incêndio de todo o mundo em uma só ferramenta, contribuindo para a agilidade no atendimento de ocorrências. O app reúne informações como localização das brigadas, escalas, acionamento para atendimento, acesso a satélites, dados de incêndios em tempo real e informações específicas sobre os brigadistas, como tipo sanguíneo, comorbidades, entre outras.

A ferramenta será lançada ainda no primeiro semestre nas lojas de aplicativos, e a prioridade dos criadores é assegurar seu pleno funcionamento para atender às necessidades das brigadas e auxiliar o atendimento de ocorrências. Após o lançamento, a expectativa é disponibilizar as mesmas informações em um site acessível por qualquer dispositivo, com o objetivo de democratizar o acesso aos dados.

O Chama foi idealizado por dois brigadistas florestais voluntários de Belo Horizonte, Adualdo Rodrigues e Lucas Leal. “As informações existiam, mas de forma dispersa. E quando estamos em uma ocorrência, precisamos de dados referentes aos brigadistas e contatos de forma muito ágil”, relata Rodrigues. Ou seja, o app visa subsidiar os setores público e privado de informações sobre as brigadas de incêndio, conferir reconhecimento a grupos que trabalham em campo e contribuir para uma ação ainda mais eficaz nas ocorrências. “Quando fornecemos recursos para empresas e governos, temos a possibilidade de que o trabalho seja reconhecido e que novos grupos sejam criados para combater incêndios”, acrescenta Leal.

Nova economia para territórios

O Inova Cerrado faz parte do Inova Biomas, iniciativa do Sebrae para impulsionar o ecossistema empreendedor nas mais diversas regiões do país. O precursor foi o Inova Amazônia, em 2022, seguido pelas versões para Cerrado e Pantanal. “Com o Inova Biomas, objetivamos criar uma nova economia para esses territórios, de forma que tenhamos uma alternativa inteligente, responsável e rentável, por meio da inovação”, aponta Philippe Figueiredo, analista de inovação do Sebrae Nacional.