
Grão Mogol
Bordado à mão livre
Artesãos inspiram-se na fauna e na flora da região para criar peças com identidade cultural no Norte de Minas
Laura Baraldi
Os pesos de porta no formato de mandacaru – cactácea que alcança até seis metros de altura e tem a aparência de um candelabro –, as almofadas que lembram cactos e os adornos para paredes com bordados de pássaros e ipês são alguns dos itens produzidos pelas artesãs de Grão Mogol, no Norte de Minas. Nos últimos anos, os trabalhos têm recebido mais reconhecimento em todo o Brasil, resultado principalmente de iniciativas promovidas pelo Sebrae Minas.

Crédito: João Guilherme
As ações junto ao setor artesanal em Grão Mogol começaram ainda nos anos 2000, quando o Sebrae Minas firmou uma parceria com um grupo de bordadeiras, o Grão Detalhe. “Nos primeiros anos, o objetivo foi capacitar as bordadeiras em design e formar uma governança que desse ao grupo um direcionamento estratégico e uma organização eficiente para alcançar novos mercados”, explica Pedro Viana, analista do Sebrae Minas.
Com as atividades, o grupo se profissionalizou, aprendeu a criar peças diferenciadas e passou a expor em eventos do setor, como a Feira Nacional de Artesanato. A partir de então, aprimorou a produção e ampliou a comercialização, atendendo inclusive a Tok&Stok, loja de móveis, decorações e acessórios com unidades em várias cidades do Brasil.
Trabalho coletivo
A história das bordadeiras de Grão Mogol é, acima de tudo, de resistência. Ao longo dos anos, as mulheres mantiveram vivas as tradições artesanais da região, transformando o bordado à mão livre em uma fonte de renda e de expressão cultural.

Crédito: João Guilherme
Atualmente, o grupo Grão Detalhe conta com 20 membros. Cirsa Francisca de Lima Faustino, a Dona Cirsa, é uma das pioneiras. O aprendizado do bordado começou na infância, com os ensinamentos da mãe e da avó, e a arte tornou-se um elemento essencial em sua vida. Para ela, o bordado é mais do que uma ocupação. “Tive muitos desafios na vida, inclusive um câncer. O bordado sempre foi uma forma de me manter bem, de manter minha mente jovem e ativa. Além disso, ele não é só uma fonte de renda, mas uma forma de conectar outras pessoas com a nossa história”, diz Dona Cirsa.

Crédito: João Guilherme
Outra integrante, Fabiane Almeida também tem o artesanato como uma tradição familiar e, atualmente, concilia um emprego formal com as atividades do Grão Detalhe. “Eu fiz cursos de bordado, ponto cruz, pintura, crochê e tricô. A minha família tem muitos artesãos, e sempre ajudei com as encomendas”, relata. Ela destaca uma curiosidade: cada bordadeira faz bordados de pássaros específicos. “Os que eu aplico nas almofadas, só eu faço. São 11 tipos, como canário, cardeal-amarelo, tiê-sangue, beija-flor, joão-de- barro, rolinha-fogo-apagou, entre outros.”

Crédito: João Guilherme
Diferentemente da maioria das bordadeiras, Maria da Conceição Andrade, mais conhecida como Dona Lia, iniciou-se na arte após a aposentadoria. “Comecei a bordar depois de uma vida inteira trabalhando como gerente administrativa. Foi algo que trouxe sentido à minha vida, me deu um novo horizonte naquele momento”, comenta.
Dona Lia reforça a importância da união entre os membros do grupo para desenvolver as peças e para a sustentabilidade da associação. “Trabalhamos muito esse associativismo, o trabalho em grupo. Inclusive, participamos de consultorias do Sebrae Minas para isso”, relata. “Há peças que dependem de várias pessoas para serem concluídas, cada uma faz uma parte. Então, se não tiver essa atuação conjunta, não tem como produzir”, complementa Fabiane.
Desafios e oportunidades
A pandemia de Covid-19 foi um período de muitos desafios para o grupo, mas também de reinvenção. Com a suspensão de atividades presenciais, o Sebrae Minas adaptou as capacitações para o formato on-line, para conseguir dar suporte ao grupo no momento de maior dificuldade. Além disso, aquele momento trouxe uma oportunidade inesperada: as mudanças no mercado de decoração. “Com as pessoas em casa, houve um aumento na busca por itens que decorassem e trouxessem mais conforto para os lares”, explica Pedro Viana.
A necessidade de diversificar seus produtos e explorar novos mercados tornou- -se uma prioridade. Para isso, foi preciso repensar as estratégias e adaptar-se às novas demandas do consumidor, que buscava cada vez mais autenticidade, inovação e conexão com a origem.
Aproveitando esse movimento, em 2023 as bordadeiras de Grão Mogol participaram do Programa Design para Artesanato, metodologia do Sebrae Minas, e renovaram suas coleções, criando peças que não apenas se adequavam às novas demandas, mas também abriam portas para novos negócios e parcerias significativas. Essas colaborações têm se fortalecido ao longo do tempo, consolidando o trabalho do grupo e ampliando suas oportunidades no mercado.
Desse momento em diante, houve um reforço na participação do grupo no Projeto Origem Minas do Sebrae, o que lhes proporcionou a oportunidade de expor nos principais eventos de decoração do Brasil, como a ABUP Decor Show, feira realizada em São Paulo. As bordadeiras de Grão Mogol também tiveram a chance de apresentar seus trabalhos no estande Origem Minas, ao lado de outros grupos de artesãos apoiados pelo Sebrae Minas, em feiras realizadas em Belo Horizonte e Brasília. Somente nos últimos dois anos, o grupo alcançou mais de R$ 120 mil em vendas nesses eventos.

Crédito: Divulgação
Outra ação de destaque ocorreu em maio de 2024, quando o Sebrae Minas realizou a Viagem para a Origem, uma ação estratégica que levou compradores dos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Santa Catarina, Bahia, Alagoas, Sergipe e Ceará e do Distrito Federal para conhecer o processo de criação das peças em Grão Mogol. A imersão permitiu que os lojistas compreendessem a inspiração cultural e a autenticidade das peças produzidas pelas bordadeiras, gerando muitas vendas. “Essas ações são essenciais para estreitar os laços entre as artesãs e o mercado. Elas não apenas ajudam a promover o trabalho, mas também valorizam a cultura local”, comenta o analista do Sebrae Minas.
Em 2025, o Sebrae Minas vai se empenhar para o fortalecimento das lideranças locais e na sucessão do Grupo Grão Detalhe, para garantir que as novas gerações estejam preparadas para dar continuidade às atividades tradicionais. A instituição continua a apoiar o trabalho com soluções para a gestão dos negócios e novas metodologias de trabalho, especialmente aplicando a inovação para o design e o desenvolvimento de novas coleções e produtos. “Tudo sempre com cuidado e respeito à origem e à tradição local, atributos que diferenciam os produtos e os tornam únicos, e promovendo a cultura de cooperação entre as artesãs”, enfatiza Pedro.
Conheça o Origem Minas
Criado em 2014, o Projeto Origem Minas busca impulsionar o desenvolvimento, a competitividade e a diferenciação de micro e pequenas empresas dos setores de agronegócio, artesanato e gastronomia em Minas Gerais. Por meio de capacitação, regularização, promoção e apoio ao acesso a mercados, o projeto realiza ações adaptadas aos mais diversos perfis e necessidades.