Histórias de Sucesso

Entrevista

NA CRISTA DA ONDA

Ecoinovação é o caminho para a continuidade do crescimento econômico com menor impacto ambiental


Cristina Mota

A ecoinovação tem promovido mudanças nos modelos de negócios e contribuído para a construção e adoção de novos parâmetros de sustentabilidade e competitividade no setor industrial de todo o mundo. No Brasil, o estudo Sondagem Especial: Ecoinovação e Transformação Digital, promovido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), divulgado em setembro do ano passado, apontou que 47% das indústrias brasileiras têm projetos ou plano de ação formal relativos ao tema – em 30% delas, os trabalhos já se encontram em fase de execução.

Entre as indústrias que integram a Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI) – grupo coordenado pela CNI, formado por mais de 500 empresas e instituições, entre elas o Sebrae –, a ecoinovação já é uma realidade: 78% delas têm planos de ação ou projetos de ecoinovação em andamento; 7% têm projetos aprovados, mas não iniciados; e 9% estão em fase de estudos para pôr em prática iniciativas relacionadas ao tema.

Ou seja, trata-se de um caminho sem volta, essencial para a sobrevivência e competitividade das empresas. Para falar sobre o tema, a Revista Histórias de Sucesso convidou o professor e pesquisador de Economia Felipe França, sócio consultor da Licorne, consultoria econômica e de inovação. Confira.

Felipe França é pesquisador de Economia
Crédito: Arquivo pessoal

O QUE É A ECOINOVAÇÃO?
Temos aí a junção de duas palavras, “ecologia” e “inovação”. A primeira se refere ao ecossistema, a tudo o que está relacionado ao nosso planeta. A segunda diz respeito a novos modelos de negócio, processos e tecnologias que substituem os até então existentes, por serem diferentes e criarem mais valor, além de atenderem a um propósito verdadeiro. Em resumo: a ecoinovação engloba as inovações relacionadas à ecologia, seja por meio do uso de novos processos e novos materiais, seja por meio do trabalho com toda a cadeia de valor e com a comunidade, entre outros pontos.

QUANDO ESSE TERMO SURGIU?
Ainda na virada da década de 1980 para 1990, as pessoas começaram a falar sobre o buraco na camada de ozônio e os gases de efeito estufa, despertando para a questão do impacto ambiental. Havia uma discussão sobre os produtos aerossóis, se eles continham a substância geradora dos buracos, o clorofluorcarboneto (CFC), o que levou, inclusive, à proibição do seu uso. Na virada de 2000, a preocupação com o meio ambiente ficou mais forte, passando a serem registrados mais movimentos inovadores. Foi quando surgiram os grandes investimentos em energia eólica no norte da Europa, as indústrias de coleta e transformação de lixo, entre outras iniciativas. Em 2015, a ONU lançou os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), um conjunto de 17 metas globais para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e promover a prosperidade para todos até 2030. Desde 2020, esse movimento se intensificou com o Fórum Global de Ações Climáticas, do Fórum Econômico Mundial. E, em 2022, com a BlackRock, a maior empresa de ativos do mundo, o movimento de descarbonização ganhou foco como nunca. Este será o caminho: descarbonização, energia limpa e novos modelos de agricultura, mitigação e/ou eliminação do impacto ambiental de grandes operações industriais, novos modelos de ocupação e gestão urbana e negócios com envolvimento de seus ecossistemas e das comunidades.

QUAIS SÃO AS VANTAGENS DA ECOINOVAÇÃO?
Na minha opinião, a ecoinovação é uma das vertentes inovadoras mais importantes na atualidade, junto da inovação em saúde. Isso porque os novos modelos de processos e negócios ligados à ecologia nos permitirão continuar tendo crescimento econômico sem gerar impacto ambiental que possa atrapalhar os ecossistemas e contribuindo para a perpetuidade dos recursos, que são finitos. É, atualmente, o maior vetor de geração de valor nas cadeias de valor da economia.

PODE CITAR EXEMPLOS DA ECOINOVAÇÃO NO MUNDO E NO BRASIL?
Por mais que o Elon Musk seja uma figura contraditória, exótica, a sua empresa é o principal caso de ecoinovação. Ela tornou real o sonho antigo da ficção científica de construir um carro elétrico, menos poluente, a partir da inovação tecnológica. No Brasil, a Natura tem a ecoinovação em seus processos, utilizando a matéria-prima de forma sustentável, aliando agroecologia e trabalho com comunidades. Aqui também temos muitos players do mercado de biodefensivos agrícolas, técnicas de agroecologia e de reflorestamento. Entre os pequenos, gosto muito do exemplo da Gerando Falcões, que é um ecossistema de desenvolvimento social para acelerar o poder de impacto de líderes de favelas. Outro caso bastante interessante é o da startup WayCarbon, de Belo Horizonte, que trabalha com gestão de crédito de carbono para as empresas.

COMO IMPLEMENTAR A ECOINOVAÇÃO EM UM PEQUENO NEGÓCIO? QUAIS SÃO OS DESAFIOS?
Eu separaria dois tipos de pequenas empresas para atuar com a ecoinovação: as de base tecnológica e as sem base tecnológica. As que integram o primeiro grupo são mais fortes, tem as startups que estão atuando com ciências da vida, nas áreas de Biologia e Agronomia, por exemplo. Já as do segundo grupo são as que atuam com processos de economia circular e energia limpa, que têm usado a criatividade na modelagem de negócios, no desenvolvimento de produtos e no uso de matérias-primas. Sobre os desafios, o principal é que o processo da ecoinovação não fique restrito ao ambiente acadêmico, tornando-se um modelo de negócio viável.

Nesse sentido, é importante o apoio governamental e de instituições, com financiamento e políticas públicas que estimulem as atividades. Acredito que o Brasil tem vantagens para a ecoinovação, dado o tamanho do país e a importância do agronegócio.

COMO AVALIA A ATUAÇÃO DO SEBRAE MINAS NO FOMENTO DA ECOINOVAÇÃO?
Instituições como o Sebrae Minas são essenciais para a ecoinovação. Isso porque esse processo demanda pesquisas e financiamento. Não é possível fazer ecoinovação sem ciência. Ao mesmo tempo, também não é possível fazê-la sem um bom plano de negócios. Considero que seria muito relevante ter um hub específico para ecoinovação, com mais programas de estímulo, políticas públicas que promovam a conexão entre os diversos atores envolvidos. Já temos movimentos em Santa Catarina, São Paulo, Paraná e em Minas, principalmente na região de Uberlândia.

QUE ORIENTAÇÃO VOCÊ DARIA AOS PEQUENOS EMPREENDEDORES INTERESSADOS NA ECOINOVAÇÃO?
Eu diria que quem se move primeiro, vence. Estamos na crista da onda do processo da economia verde, que chegou para ficar e é crescente. Então, aqueles pequenos empreendedores que se adequarem para aderir a esse movimento, que conseguirem incluir a ecoinovação em seu core business, com responsabilidade e muito estudo, têm grande potencial de sucesso. Isso também vale para pequenos negócios já estabelecidos e para novos, sendo que quem já modela o empreendimento de acordo com a economia verde vai ter mais espaço e gerar mais impacto do que se não tivesse esses princípios como guias.